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“Entrevistão”: Oswaldo “Rock” Vecchione, do Made in Brazil

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Quando surgiu a oportunidade de entrevistar o pessoal da banda Made in Brazil, já pensei, de pronto: “Vai ser no formato ‘entrevistão’!”. “Entrevistão” é quando o artista que vamos conversar tem estrada, carreira longa, casos que renderiam dezenas de biografias. Quarenta e oito anos é estrada a dar com pau! E o fato de ser às vésperas de um show especial, festivo, com mais de quarenta convidados no palco, torna o papo mais proveitoso ainda. “Vocês gostariam de ficar depois e acompanhar o ensaio?”, perguntou a assessora de imprensa Valéria Gaspar a mim e ao fotografo do Azoofa, Gustavo Kamada. Concordamos de imediato e na – extremamente – chuvosa quarta-feira, 4 de novembro, partimos em direção ao Garage Studio, na região da Pompeia – berço da banda e do rock na nossa cidade, vejam vocês!

Sentado à mesa com a lenda Oswaldo “Rock” Vecchione, que compartilhou boas doses da vivência que só a experiência de ter uma banda de rock há quase meio século faz acumular – sob a cuidadosa supervisão de seu irmão, Celso “Kim” Vecchione, o homem da memória impecável – vi figuras de peso entrarem na sala e se juntarem ao time, como Sérgio Hinds (O Terço), Johnny Boy (Raul Seixas, Walter Franco, Sérgio Dias, Ira!, entre outros), Clemente (Inocentes) e Theo Werneck. O diálogo foi mais ou menos assim:

AZOOFA - Tudo começou por aqui, mesmo, na Pompeia. Qual a importância desse bairro para o rock n’roll paulistano?

Tinham bairros sem nenhuma banda de rock, aqui tinham várias. Em uma certa época, no começo dos anos 70, tinham quatro bandas que excursionavam pelo Brasil levando o rock. Uma delas era do Rio, que era o Terço. As outras três eram da Pompeia: Os Mutantes, o Tutti-Frutti, que a Rita veio trabalhar depois que saiu dos Mutantes, e o Made. Depois apareceram no circuito o Casa das Máquinas, os Pholhas. Mas tanto os Pholhas como o Casa das Máquinas eram bandas de baile, que tinham um set de rock legal e que resolveram investir nesse set. O oposto do Made, Rita Lee e Tutti Frutti, que são músicos focados no rock, que começaram no rock e tão no rock. A Rita saiu um pouquinho pra fazer um lance mais rock pop, mas é lógico que tem toda uma referência dentro do rock.

Você é o único que não deixou a banda nem por poucos meses, desde a fundação. Nenhum outro projeto – até em outras áreas –  te seduziu a ponto de largar o Made, mesmo que temporariamente?

Dentro do Made eu trabalhei com muitas coisas. Fui forçado a virar produtor de shows, por exemplo. Quando a gente parou de gravar com multinacionais, como nos quatro primeiros discos, que são da RCA (hoje em dia o catálogo está com a Sony), e nos três seguintes, que são da RGE, que não era uma multinacional, mas era uma gravadora de médio porte no Brasil, a gente resolveu investir. Numa certa época – quando o Made mais trabalhou, mais ou menos até lançar os dois Piratas (discos ao vivo) –, de 75 a 89, eu fui produtor de 60% dos shows. O restante eu vendia. Era assim: se a gente tinha algum produto novo, um disco ou um show e queria tocar, sei lá, em Campinas, em Porto Alegre, em Belo Horizonte, ou em Blumenau, eu tentava vender. Se eu não conseguisse, dava um pulo na cidade, alugava um espaço que poderia ser um ginásio, um teatro, um auditório ou um salão grande de um clube e produzia. Eu tinha um esquema de uma gráfica forte por trás, um pessoal que colava cartazes pra mim aqui ou em qualquer lugar. Uma vez foram colar cartaz pra mim no Rio de Janeiro e lá não tinha esse esquema. Os cariocas se assustaram quando o Made chegou. Era pra lançar o Banana (disco de estreia, homômino, apelidado pelos fãs e pela banda de O Disco da Banana), a gente ficou duas semanas no Teatro Tereza Rachel e já chegou importunando! O cartaz dizia: “Não acreditamos que o carioca não gosta de rock!”. Aqueles puta lambe-lambes na parede… nossa senhora! Mas foi legal, foi uma temporada que rendeu casa cheia. Isso era legal pra divulgar o show, mas também foi um tiro no pé no show Massacre, em 77. De um dia pra outro cinco mil cartazes na rua, com um tanque de guerra esmagando a palavra “Massacre”. Era pra esmagar umas cabeças, mas no final a gente resolveu tirar as cabeças e colocar a palavra “Massacre” e o tanque andando em cima. Isso aí nos rendeu o cancelamento da tour e a apreensão do equipamento.

Por conta dos cartazes?

Lógico! Ditadura, governo militar, censura. Eu aluguei o Teatro Aquário, que era, dos particulares do Brasil, o maior, eu acho. 1400 ou 1600 lugares. Minha memória não tá tão boa, mas de qualquer jeito era o maior que tinha e aluguei pra duas temporadas, duas semanas. A gente levou o equipamento na segunda, montamos na terça, na quarta fizemos o ensaio geral e na quinta começava a temporada. Quinta, sexta, dois shows no sábado, dois no domingo e na outra semana a mesma coisa. Na quinta-feira, o (ator) Altair Lima – que era dono do teatro – me ligou, quase chorando, as quinze pras seis da manhã. Ele falou: “Oswaldo, pelo amor de Deus, cara, o que vocês fizeram? Os caras interditaram a rua! O teatro tá lacrado!”. E com o nosso equipamento dentro! O Altair produzia peças infantis de sábado e domingo, então o prejú que a gente ia levar ia ser dobrado pra ele. Não era nem oito horas da manhã e a gente já tava no teatro com ele e ele apavorado, branco com o lábio roxo. Pensei que ia ter um infarto! Ele falou: “Não, cara, vocês têm que dar um jeito! O que vocês fizeram? Acho que foram esses cartazes, vocês sujaram a cidade! Quantos cartazes vocês colocaram?”. Eu falei: “Botamos cinco mil e ainda tem dois mil guardados pra semana que vem.”. Ele disse: “Não, não bota mais nenhum!”. 

Você ainda tem esses cartazes?

Não, tenho só o arquivo. Depois virou a capinha do disco. Aliás, esse ano a gente lançou o Massacre em vinil.

Isso que eu ia te perguntar agora! Foi censurado na época, saiu em CD em 2005 e esse ano com uma tiragem de trezentas cópias em vinil, é isso?

Trezentas cópias, pra colecionador. Disco colorido, numerado.

Do jeito que era pra sair na época! Eu ouvi dizer que vai sair um Massacre Vol. 2. Como vai ser isso?

Já estou negociando. Eu arrumei um arquivo de um show no Rio, com o Wander Taffo na terceira guitarra, junto do meu irmão e do Dudu Chermont, o Percy Weiss (segundo vocalista da banda, falecido este ano) nos vocais, eu no baixo e o Juba, que depois saiu do Made e foi pra Blitz, na batera. Além disso, tem cinco sobras que estão no CD, mas não entraram no LP, porque vinil é aquela coisa, dezessete minutos e meio de cada lado, senão perde a qualidade. Então o lado A do Vol. 2 provavelmente terá essas sobras e o lado B será o melhor dessa uma hora e vinte, uma hora e vinte e cinco minutos que eu tenho desse show.

Sai esse ano, ainda?

Não. Provavelmente sai pros cinquenta anos do Made. Tô negociando com o Danilo (Guedes), da Mafer Records, que fez com o maior capricho essa tiragem do Massacre, ou lançar em LP um desses discos com material inédito que a gente só soltou em CD, tipo o Sexo Blues e Rock n’Roll e o Rock de Verdade, um daqueles acústicos ou algum material com o Cornelius (Lúcifer, primeiro vocalista da banda, falecido em 2013) cantando. Ele até me pediu isso, pra gente soltar um disco do Made em tributo ao Cornelius. Eu tenho muita coisa em VHS. Já comecei a levantar esse arquivo pra depois dar uma masterizada no áudio e ver se é possível mesmo lançar um LP tributo à ele.

Em 1974, ano de lançamento do primeiro disco do Made, também foram lançados outros marcos do rock nacional, como o Gita, do Raul Seixas e o Loki, do Arnaldo Baptista. Supondo que estivéssemos naquele ano em uma loja de discos e um cara estivesse em dúvida em qual LP comprar, por que você indicaria o do Made?

O disco do Arnaldo é genial e o do Raul talvez seja o que eu mais goste da discografia dele. Mas o Made tinha uma coisa que nem o Raul e nem os Mutantes tinham, que era o foco no rock. Tanto os Mutantes, quanto o Arnaldo e o Raul, flertavam com outras coisas, outros estilos. O Raul tinha toda a cultura dele da Bahia, do nordeste, ele fez muita coisa em cima de baião. O Arnaldo levou a veia rock pros Mutantes, depois eles caíram praquela coisa mais Yes, mais progressiva, uma coisa que o Serginho (Dias) gostava muito. O Loki é um disco de rock muito bacana e eu adoro, tenho em CD e em vinil. Mas o Made tinha o Cornelius, tinha todo o tesão de um primeiro disco. Pra você ter uma ideia, a gente entrou na RCA com todo o apoio da gravadora. Eles deram uma puta grana adiantada pra gente pra montar o show, investir no guarda-roupa, investir em equipamentos bons de P.A., em instrumentos importados e tal. A RCA tinha os melhores estúdios de São Paulo e provavelmente do Brasil. Tinha o estúdio B, 8 canais, e o A, 16 canais. Eram sessões de seis ou doze horas. A gente pegou três sessões de doze e o negócio não andou. Não por causa da banda, não andou porque os técnicos queriam uma coisa limpa, uma voz alta, o instrumental lá embaixo. A gente queria sujar as guitarras e os caras não entenderam a linguagem. Aí eu parei as gravações e fiz uma reunião com o Osmar Zan, que era o diretor artístico. Ele entendeu o que eu falei e disse: “Vamos parar por uma semana e eu importo um técnico argentino.”. Aí veio um cara, que já tinha trabalhado na RCA da Argentina e gravado várias bandas de rock, e que finalmente entendia a nossa linguagem. Ele chegou a tocar guitarra com a gente em uma música ou duas, dava uns puta toques bacanas. Acabamos sendo meio que cobaias dele. Só que teve um detalhe, o Cornelius era genial, mas era muito agudo, estridente. Então a gente queria esconder um pouco a voz dele pra não chocar muito. Até porque a gente queria uma massa sonora, então quanto mais você abaixa o vocal, melhor o resultado pra encorpar o som. A única coisa que acabou sendo rejeitada por eles foi a mixagem que eu e o meu irmão fizemos, aí fizeram uma segunda mixagem. Eu tenho o rolo do primeiro disco do jeito que a gente mixou, um pouco diferente do resultado final. O primeiro disco teve três músicas de sobra, o segundo, três, o terceiro, três, o quarto, cinco. Só o que se mixava era guardado pela gravadora. Aquelas fitas largas eram muito caras, então se reaproveitava tudo. Muitas músicas que poderiam dar um disco inédito ou virar bônus se perderam. Eu cheguei a ir na RCA, no Jaguaré, na época, quando eles relançaram a série Acervo, uma compilação dos sucessos. Fui lá pesquisar e não tinha nada. Fucei tudo, os arquivos, mas foi tudo perdido.

A banda possui várias influências, mas podemos dizer que Rolling Stones foi o ponto de partida do Made in Brazil?

Eu acho que foi o ponto de afirmação, porque a gente não tocava só Stones, tocava Kinks, Animals, Yardbirds…

Mas e quanto à atitude e o visual de um Mick Jagger, um Brian Jones, um Keith Richards?

O Elvis, com o visual dele, nos influenciou. Eu sou um garoto branco que tentou usar topete, mas meu cabelo sempre foi muito liso. A gente passava cada coisa no cabelo…! Não existia laquê na época, teve alguém que falou pra mim: “Se você enfiar o pente no copo de cerveja e passar no cabelo, daqui cinco, dez minutos, ele fica do jeito que você pentear!”. Eu cortei o cabelo três vezes “escovinha”, tipo americano, deixava meio curto, ele naturalmente caia pra frente e ficava aquele topetinho. Quando apareceram Os Beatles, que eu descobri escutando no programa do Miguel Vaccaro Netto, acho que Rádio América, aquilo me encantou! No dia seguinte, saí querendo comprar o disco deles. Eu tive o mesmo impulso quando escutei Little Richard, não sei se em 1955 ou 1956. O meu pai gostava de música orquestrada, colecionava discos de orquestra. Já a minha mãe gostava de coisas populares, tipo Francisco Alves e Nelson Gonçalves. Eu sabia onde o meu pai comprava discos: na Sears! Aí eu e meu irmão fomos lá no sábado, já que todo sábado meu pai dava uma grana pra gente comprar figurinha, gibi, pra ir no cinema e tal. Como a gente tinha escutado o Little Richard no rádio – um dia trocamos de estação enquanto a empregada ouvia a sua tradicional radionovela, ao mesmo tempo que passava a roupa, e nos deparamos com Little Richard cantando “Lucille” – e ficado maravilhados, tentei passar uma mensagem pro vendedor da loja, que, de certa forma me entendeu e acabou me vendendo um disco do Elvis, do filme O Prisioneiro do Rock. Cacete, bicho! Aí a gente diminuiu as figurinhas e gibis e começou a comprar discos, 78 rotações e tal. 

Quando eu escutei Beatles, isso depois, em 1962, 1963, foi a mesma coisa. Eu sabia que na Av. São João tinham várias lojas de discos, então eu fui lá. Comprei o She Loves You, fui pra casa, fiquei analisando aquelas fotos e vi que aqueles caras não penteavam o cabelo. Pensei: “Acho que se a gente lavar, vai ter esse penteado!”. Tiro e Queda! No dia seguinte eu fui à escola com esse cabelo. E era engraçado porque eu era um zero a esquerda, as menininhas nem olhavam pra mim, principalmente as mais velhas. E um amigo fez a mesma coisa. Aí estamos nós dois lá de “Beatles” no recreio… foi quando eu senti o poder do rock! Meninas que nos ignoravam, que nunca repararam na gente, passavam, voltavam e ficavam olhando. Quando eu ganhei um disco dos Stones, do Cornelius, inclusive, mudei a estética pela terceira vez. Eu vi que o Bill Wyman, baixista, já tinha saído daquela fase “cabelinho tigela” e tava usando cabelo no ombro. Pensei: “Que legal, vou deixar meu cabelo crescer!”. Aí eu e meu irmão já estávamos com o cabelo comprido. Muito doido, isso. Como o Neil Young fala, o rock é que nem ferrugem, depois que te pega você não consegue se livrar mais.

O que podemos esperar do show no CCSP? Depois vocês continuam com a turnê Combate Rock ou ainda tem mais algum show especial ou tributo em 2015?

Desde 1978 ou 1979, desde os doze anos do Made, a gente faz uma comemoração anual. Naquela época já tinham vários “ex-Mades”, o Cornelius já era um deles. Fizemos um show no salão de festas do Palmeiras, ele veio, cantou. Todo ano a gente faz algo, as vezes o lugar é melhor, as vezes é um bar. De repente coincidiu de, este ano, o Centro Cultural abrir essa data e, já que a gente não tinha feito nenhuma comemoração, resolvemos juntar! É um lugar legal, tipo arena, do jeito que a gente gosta. Vai ter público em frente, atrás, dos lados, de pé, sentado…

Vários convidados especiais… 

Sim, meu irmão, meus filhos e os músicos até falaram que dessa vez eu exagerei. Com o Serguei, são quarenta e um músicos que vão estar em cima do palco tocando e cantando a última música, “Minha Vida é Rock And Roll”. Eu fico feliz e até emocionado. É uma maneira de estar com pessoas que contribuíram e até mesmo gente que não é da nossa banda, mas é amigo e tem o rock como um elo de aproximação. São momentos especiais. Depois seguimos turnê, normal. Estamos usando esse show, também, como um preparativo pras comemorações que se aproximam, dos cinquenta anos. Dentro dessas comemorações existe um longa, um documentário, que está sendo feito pelo Egler Cordeiro, cineasta paranaense, que há quatro anos viaja com a gente e registra shows especiais, festas, coisas importantes. Ele já entrevistou a maioria dos caras que ele acha que são especiais pro Made e tá nessa fase de entrevistar amigos e até pessoas que não tem proximidade comigo e com o meu irmão, e com o Made, mas pode dar um depoimento pra falar da nossa carreira e da nossa luta. 

Que mais que pode sair de coisa inédita do Made?

O Mário Silva, jornalista que trabalha com a gente, tá escrevendo uma biografia, o Tony Monteiro, ex-editor da revista Rock Brigade e atualmente colaborador da Roadie Crew, hoje mesmo me ligou e também tá com um projeto de uma biografia. Pra ele é até mais fácil, porque ele já lançou uma minibiografia da banda na Rock Brigade em 1989 e, há três anos, dezoito páginas da nossa história em três edições da Roadie Crew, com mais de cinquenta fotos. Acho que ele tem dezoito horas de depoimentos meus falando do Made e umas quatro ou cinco horas do meu irmão. Tem a Tuca Fasano, que é outra jornalista que, há pelo menos três anos, faz algumas viagens com a gente, frequenta os nossos ensaios e tá fazendo um registro com um enfoque em biografia também. Eu tenho um projeto, que acabei parando devido ao acidente com a Débora e não tive mais tempo – nem vontade – de fazer, mas que agora vou retomar. É um livro, sugestão do Eric, um dos meus filhos, que conta quarenta histórias – era pra sair na época que o Made comemorou quarenta anos – diversas da banda. Agora vão virar cinquenta. Fatalmente, nessas histórias, eu vou citar a maioria dos músicos que tocaram com a gente, coisas que aconteceram em ensaios, viagens, gravações e programas de TV. Tem muita coisa hilária.

Oswaldo, por que você resolveu assumir o vocal da banda por completo no disco Minha Vida É Rock ‘n’ Roll? Seus vocalistas te davam muita dor de cabeça?

Eu comecei como segundo guitarrista, meu irmão sempre foi o primeiro. Ele que me ensinou a tocar, inclusive. De 1967 a 1972, início de 1973, eu fiquei nessas. A gente teve uma fase em que o nosso baixista na época, o Alberto, vazava quando chegava o verão e a gente era obrigado a botar um segundo baixista pra cumprir a agenda de shows na temporada. Ele simplesmente ia viajar, não queria nem saber! E em 1972 a gente começou a compor o que viria ser futuramente o material do Banana, mas o Aberto não sentia firmeza. Ele não achava que a banda tinha que investir em músicas em português. Ele achava que, como a gente tocava os mega sucessos de todo mundo, não ia ter material próprio à altura do que o pessoal fazia lá fora. Erro dele. Aí chegando o verão, a gente já sabendo que ele ia abandonar a banda, resolvemos procurar um baixista pra colocar no lugar dele em definitivo. E testamos um, testamos dois, teve um que fez até um anúncio publicitário com a gente mas acabou nem ficando no Made, o Rafael. Aí meu irmão falou: “Se a gente não arrumar alguém logo, vai acabar parando. Passa pro baixo pra gente continuar ensaiando e a hora que pintar um baixista você volta pra guitarra!”. Acabei adaptando um jeito de tocar com uma linha melódica meio Stones, mas com um baixo heavy metal junto. Eu não tinha referência de ninguém que tocava igual. Depois eu fui ver que a Suzy Quatro tocava assim, o baixista do Status Quo (Alan Lancaster) também, além dos caras que foram aparecendo, como o (Geezer Butler) do Black Sabbath, o (John Wetton) do Uriah Heep e o (Roger Glover) do Deep Purple, as vezes. Em 1979 a gente já tinha passado por três ou quatro cantores antes de gravar o primeiro disco. O Cornelius saiu da banda brigado, o Percy gravou o Jack O Estripador (segundo disco do Made), mas eu queria um cara mais técnico que ele. Botei o Caio Flávio pra gravar o Paulicéia Desvairada (terceiro álbum da banda), mas ele não se fixou, aquela formação não deu muito certo. Ele era muito técnico, mas o esquema não deu certo. Mudamos a estética da banda, a linha melódica e gravamos mais baladas, r&b e blues.

Aí que surge o dedo do Ezequiel Neves (crítico musical e produtor dos discos do Made Jack O Estripador e Paulicéia Desvairada)? 

O Zeca nos ajudou no Jack e no Paulicéia. Ele entrou na história pra gente não correr mais aquele risco de fazer a gravação do jeito que a gente queria e, de repente, a gravadora achar que tinha que ter um dedo mais comercial ali no lance. A gente botou o Zeca lá como amigo, pra ele assinar lá. Ele não entendia nada de gravação. Mas, pô, quem iria contra o maior crítico de rock do Brasil? O que ele falava e escrevia eram leis! E ficou do jeito que a gente queria. O Zeca subiu em cima do palco também, cantou com a gente, fez as viagens. Convivemos muito. Ele era do cacete. Como pessoa, ele faz muita falta também (Ezequiel faleceu em 2010). Sinto muita saudade dele, da alegria, do alto astral. Nas viagens, é importante ter um cara alegre, que não deixa a peteca cair, que faz uma piada atrás da outra, que conta casos da vida dele e dos outros. A gente ria muito com o Ezequiel. E com muitos músicos que viajam com a gente até hoje também. Eu e o meu irmão as vezes abrimos mão de ter um cara técnico pra ter um amigo, alguém que tá aprendendo. Durante esses quarenta e oito anos, a gente investiu em muitos amigos e em muitos músicos que a gente achava, como pessoa, fundamentais pra estarem com a gente naquele momento. Não tanto como músicos, como guitarrista, como baterista, tecladista, sacou? É loucura falar isso, afinal somos uma banda de rock. Mas essa é a verdade. Talvez seja esse o motivo da nossa longevidade.

Obrigado pela entrevista, foi uma honra. Gostaria de deixar alguma consideração final?

Queria convidar o pessoal pro show, a ideia é se divertir! Como o Ezequiel falava, rock é um exercício de descontração, é alegria. A gente tenta passar isso pras pessoas, sempre tentamos. Quando a gente consegue, maravilha!

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